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Foto do escritorGabriel Turano

Uma surpresa agradável: Moçambique de moto!

Atualizado: 5 de ago. de 2023

Recentemente retornei de uma bela jornada pela Namíbia e Botsuana. Viajar de carro é, sem dúvida, mais confortável do que viajar em duas rodas, além da possibilidade de carregar mais acessórios, o que torna a jornada mais confortável. No entanto, é em duas rodas que sempre sinto a liberdade do vento no rosto, da temperatura ambiente e a conexão profunda que tenho comigo mesmo. É na moto que me conecto 100% e nas longas horas de pilotagem que reflito sobre todas as experiências que vivenciei.


Assim como a jornada pela África do Sul, Lesoto e Suazilândia, também iniciei esta em Joanesburgo. Meu visto estava prestes a expirar e eu ainda precisava preparar a moto com os acessórios que senti falta durante a outra viagem. Experiência é, de fato, aquilo que aprendemos quando não conseguimos alcançar o que queríamos.

Em JHB após instalar o sistema de bagagem

Desta vez optei por adquirir "soft bags" de uma marca sul-africana conhecida como Tuskana. Fui apresentado à marca alguns dias antes na maior feira de agronegócio do hemisfério sul, onde participei representando a Hero, é claro, com a presença da minha linda Lucile.


NAMPO - Maior feira de agronegócio do hemisfério sul

Além do novo sistema de malas, que me permitiu carregar mais equipamentos de camping, também decidi investir em um riser para tornar a pilotagem mais



confortável e evitar as dores nas costas que sentia. Ambos os pneus foram trocados, pois não me sentia confiante em encontrá-los em Moçambique devido à infraestrutura local. Aproveitei também para trocar o óleo antecipadamente, baseado no mesmo argumento mencionado.


De Joanesburgo a Maputo, a capital de Moçambique, são 544 km. É facilmente executável em um veículo de quatro rodas, mas seria uma jornada bastante cansativa de motocicleta. Optei por fazer uma parada na bela cidade de Nelspruit, a 340 km de distância, cruzando a fronteira no dia seguinte pela manhã.


Era maio e o clima mais frio já se fazia presente em Joanesburgo. No entanto, ao cruzar a fronteira para Moçambique, os ventos do Oceano Índico indicaram que teria temperaturas mais agradáveis nos dias seguintes. Apesar da má reputação dos policiais em Moçambique, não encontrei problemas e cruzei a fronteira rapidamente, o que me permitiu chegar a Maputo ainda pela manhã.


Maputo me impressionou positivamente. Como capital do país e centro financeiro, é também a cidade mais populosa de Moçambique. Fiquei hospedado próximo à região central e encontrei todo o conforto que se espera de uma capital. Passei alguns dias explorando a cidade, inclusive cruzando a famosa Ponte Maputo-Katembe, que inicialmente foi planejada com financiamento português, mas devido à crise que

Portugal enfrentava, a ponte foi construída e financiada com capital chinês. A cidade também possui uma vida noturna vibrante, com bares e restaurantes à beira-mar, e uma gastronomia que me impressionou em comparação com outros países africanos.

Cidade de Maputo - Capital de Moçambique

Como de costume, evito grandes cidades e busco explorar mais as cidades do interior, onde sinto a presença da cultura local de forma mais intensa. Moçambique é uma antiga colônia portuguesa, então tive o privilégio de falar o mesmo idioma. Embora o português seja amplamente falado no país, a população local, que é dividida em diversas tribos, mantém seus dialetos locais e se comunica entre si por meio deles. A guerra civil que se prolongou por mais de 15 anos após a independência devastou o país e resultou em um dos mais baixos Índices de Desenvolvimento Humano (IDH) do planeta.

Mulheres trabalhando na coleta de ostras

Essa realidade, que é pouco visível em Maputo, se torna evidente quando saímos do centro financeiro e nos deparamos com a extrema pobreza, a carência e a falta de acesso aos serviços básicos pela população, como moradia, alimentação, saúde, educação e segurança.

Paradoxalmente ao que foi mencionado anteriormente, em 2010, Moçambique descobriu reservas de gás no norte do país, que se tornaram as maiores do continente e as quartas maiores do mundo. Esses recursos naturais, se bem gerenciados, poderiam representar uma virada de jogo e mudar a realidade do país. No entanto, infelizmente, o curso dos eventos tomou um rumo diferente, e o país enfrentou diversos conflitos armados, incluindo a presença de grupos terroristas.


De volta a Maputo, planejei meus próximos passos em direção ao norte, pois tinha planos de cruzar o Malawi, Zâmbia e Zimbábue antes de retornar à África do Sul. Moçambique possui uma longa costa com quase 3.000 km de extensão, fazendo fronteira ao norte com a Tanzânia e ao sul com a África do Sul.


Era hora de iniciar a jornada em direção às belas praias, mas também de conhecer genuinamente a realidade do país. Meu próximo destino era ao norte de Xai-Xai, em uma região conhecida como Chidenguele, a cerca de 278 km de distância.

Uma vendedora no mercado local

A rota seguia pela N1, uma estrada que acompanha a costa até Vilankulos, antes de adentrar o interior do país. É uma rodovia de mão única com mudanças frequentes de velocidade, o que atrai a atenção dos policiais que estão presentes em todos os lugares com radares de velocidade. Em Moçambique, é preciso de muito tempo para percorrer distâncias relativamente curtas, mas como aprecio mais a jornada do que o destino em si, esse detalhe não se torna um obstáculo.


Chidenguele é uma pequena vila localizada na província de Gaza, conhecida por suas belas praias que só podem ser acessadas por veículos 4x4, devido às dunas de areia, ou no meu caso, por uma motocicleta leve que permite levantá-la facilmente em caso de queda (o que ocorre com frequência).

Bungalow que utilizei como hospedagem

Fiquei hospedado em um belo bungalow de frente para a lagoa de Inhampavala, a poucos metros da praia. Fui privilegiado por ser o único viajante no local, podendo desfrutar plenamente do silêncio e da tranquilidade que geralmente me acompanham.


Aproveitei alguns dias para explorar a região, percorrer de moto as divertidas estradas de areia e, é claro, desfrutar da linda praia local.

Conheci também um restaurante local, cujo dono era o Mario. Ele havia vivido muitos anos trabalhando na África do Sul e recentemente retornou ao seu país de origem, estabelecendo-se e criando raízes naquela vila. Frequentei seu restaurante por vários dias, sempre acompanhado de boas conversas e informações sobre a história de Moçambique.

Restaurante do querido Mário

Continuei minha viagem em direção a uma região bastante popular conhecida como Inhambane, mais especificamente a praia de Tofo. Essa região é frequentada principalmente por europeus e americanos que visitam Moçambique. Os estrangeiros são atraídos pelas belas praias, pela observação de baleias durante a temporada de migração e pelos famosos pontos de mergulho, onde é possível encontrar grandes animais marinhos, como tubarões-baleia, arraias e tubarões, entre outros.

Inhambane também é conhecida como a "terra de boa gente" devido à natureza amigável, gentil e descontraída de sua população local.

Cortando o cabelo em um salão local

Basta caminhar pelo pequeno vilarejo para que os moradores se aproximem para conversar. Na região, há também bons restaurantes e acomodações.

Infelizmente, devido às condições climáticas desfavoráveis, com fortes rajadas de vento, não consegui mergulhar e fazer snorkel com os tubarões-baleia em Tofo. Decidi, então, continuar minha viagem em direção ao norte.


Seguindo as indicações dos moradores locais, dirigi até Morrungulo, que também faz parte da província de Inhambane. São 160 km de distância e mais de 4 horas para percorrer o trajeto, devido às frequentes reduções de velocidade, postos de controle e à estrada de areia nos trechos finais. Na região, predominam os resorts com preços exorbitantes, mas encontrei uma excelente área de acampamento em frente a uma praia deserta.

Praia de Morrangulo

No primeiro dia, tive vizinhos holandeses que viajavam de 4x4, mas na segunda noite fui o único habitante do local. A praia realmente merece ser visitada, com sua cor azul-turquesa, temperatura agradável e coqueiros por toda parte. É um lugar impressionante em termos de beleza e como bônus, é praticamente desconhecido pelos turistas estrangeiros devido à falta de divulgação do local.


Estava ansioso para conhecer meu próximo destino: Vilankulos. Ao norte de Morrungulo, é também onde a N1, a estrada mencionada anteriormente, deixa de seguir a costa e adentra o interior do país. É nessa região que as coisas começam a ficar um pouco mais desafiadoras devido à infraestrutura.

Encarando as estradas de Moçambique

São 180 km que separam as duas cidades, mas como mencionei anteriormente, leva horas para percorrer esse trajeto pelas razões já citadas. Vilankulos possui uma boa infraestrutura em termos de supermercados, postos de combustível e até mesmo um mecânico local para manutenções básicas.

Praia de Vilankulos

A cidade também serve como porta de entrada para explorar as ilhas do arquipélago, especialmente a Ilha de Bazaruto. Fiquei hospedado em uma tradicional cabana de frente para a praia, construída com base no conhecimento transmitido por gerações. Não imaginava que ficaria lá por tantos dias.


Um pequeno acidente quase me tirou de combate. Ao ir ao banheiro, não percebi que o batente da porta era muito baixo e acabei batendo a cabeça. Não perdi a consciência, mas fiquei bastante tonto com o impacto. Como havia bastante sangue, decidi ir rapidamente ao hospital público, que ficava a poucos metros de distância do local onde estava hospedado. Foi nesse momento que pude ver a falta de investimento público no acesso à saúde. Com falta de materiais básicos para atendimento, como compressas, antissépticos, linha e agulha para os pontos necessários, não consegui receber o atendimento necessário.

Dando pontos na cabeça

Felizmente, encontrei uma clínica particular a alguns quilômetros de distância da cidade e, apesar do alto custo, recebi o tratamento adequado. O resultado? Fiquei de repouso por 8 dias, sem poder me locomover, nadar ou praticar qualquer atividade.


Esse período de descanso forçado me permitiu criar conexões com os moradores locais, explorar a cidade de forma mais detalhada e, no final dos dias de descanso, fazer parte do time de futebol que jogava na praia ao entardecer, aproveitando a maré baixa.


Visitei, também, uma escola local ao norte de Vilankulos. Infelizmente a educação, assim como diversos países, é um desafio a ser vencido em Moçambique. Na falta de estrutura, os alunos sentam em troncos de árvores ou na areia para assistir as aulas.

Escola municipal

Com as energias recuperadas, era hora de continuar a viagem. Meu destino seguinte era Chimoio, uma cidade localizada no interior do país e uma base para quem chega ou parte em direção ao Malawi e ao Zimbábue. Essa também é uma das estradas mais desafiadoras devido à falta de manutenção. Repleta de buracos, sem pavimentação e com a presença de caminhões e ônibus que percorrem o trajeto, tornou-se um trecho bastante perigoso. Há obras em andamento, algumas financiadas pela China e outras pelo Banco Mundial. É provável que, no futuro, as más condições da estrada sejam melhoradas.


Eu já havia percorrido mais de 250 km dos quase 500 km que separam as duas cidades quando decidi fazer uma pausa para esticar as pernas. Ao olhar para a traseira da moto, percebi que a placa havia sumido. Provavelmente eu a perdi durante o percurso devido às vibrações excessivas.

A temida estrada para Chimoio

Naquele momento, tive que tomar uma decisão: continuar a viagem correndo o risco de enfrentar problemas na fronteira e, caso minha entrada fosse negada, ter que percorrer mais de 1500 km de volta a Maputo em poucos dias, considerando que meu visto estava prestes a expirar, ou retornar a Vilankulos e replanejar minha rota.



Optei pela segunda opção e fiz todo o caminho de volta a Vilankulos, na esperança de encontrar a placa caída no chão. Esse episódio me custou mais de 10 horas de pilotagem e cheguei completamente exausto e sem a placa.

Sem a possibilidade de obter uma nova placa a tempo, no dia seguinte iniciei o caminho de volta a Maputo. De Vilankulos, segui diretamente para Tofo (mais de 300 km). Aproveitei minha breve estadia em Tofo para realizar uma atividade que não pude fazer em minha última visita devido às condições climáticas: mergulhar com os tubarões-baleia.


Assim como em um safári, não há garantia de encontro, o que torna a experiência ainda mais intensa. Saímos em um barco pela manhã em busca dos tubarões-baleia e, em menos de 1 hora, avistamos um não muito longe da costa. Apesar de carregarem o nome "tubarão", o que infelizmente erroneamente os associa a animais perigosos, os tubarões-baleia se alimentam principalmente de plâncton e ocasionalmente de pequenos peixes. São animais extremamente curiosos, o que torna os encontros especiais.

Tubarão-baleia

Mergulhar próximo a um animal tão majestoso como esse apenas reforça a importância da preservação e destaca que, embora sejamos 8 bilhões de pessoas no mundo, precisamos aprender a compartilhar esse planeta com mais responsabilidade e consciência.


Em Tofo, comecei a sentir que meu corpo não estava nas melhores condições. Cansaço frequente, dores musculares e uma crise de sinusite tornaram-se mais presentes. Considerando que Moçambique possui um dos maiores índices de malária do continente, decidi visitar um hospital local para fazer o teste. Felizmente, o resultado foi negativo.

De Tofo, segui diretamente para Maputo, em uma viagem bastante exaustiva devido à longa distância envolvida (mais de 500 km). Passei o dia na estrada e entrei na capital em horário de pico. Normalmente, evito percorrer longas distâncias em um único dia, mas as circunstâncias em que me encontrava me levaram a tomar essa decisão.


Já um pouco debilitado pelos dias anteriores e pelo esforço do dia anterior, os dias que se seguiram em Maputo foram preenchidos com algumas visitas ao hospital, muito descanso e horas na cama. Uma crise aguda de sinusite havia se instalado, e o descanso era o remédio necessário para superar esse desafio.


Com o visto prestes a expirar, peguei a estrada novamente em direção à fronteira de Essuatini. Optei pelo posto migratório de Namaacha devido à sua proximidade com um lugar muito especial: o Parque Nacional de Hlane.


Mas essa é uma história para outro momento. Um abraço,


Gabriel Turano



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